Sou tia. Uma
tia velha e babona demais pra estar no mundo. Enquanto todos os meus amigos já
têm sobrinhos completando lá seus dez anos, eu tô agora naquela fase ridícula
de ficar estudando, de longe, as fotos, pra saber se a sobrancelha da pequenina
parece com a minha. E posso te garantir uma coisa: não pa re ce por ra ne nhu ma.
O rosto é todo da mãe, mas o cabelinho grosso e preto demais
entrega que essa vai ser uma devoradorazinha de tahine, é só esperar. Puxou ao
pai também o gosto por comer e dormir, coisa que faz, basicamente, o dia
inteiro. Tudo nessa vida de bebês é feito de clichês; eu a acho linda, apesar
de ser só um bebezinho, e fico me perguntando se a bichinha realmente é
bonitinha ou se algum traço genético me faz achar um joelhinho a coisa mais
linda do mundo.
E aí vem os
diálogos bizarros.
“Como está
a vida de papai? –Não sei, ainda não tive a oportunidade de pegar minha filha
no colo”.
“Como é
esperta! -Como assim? Porque está viva? Se isso é esperteza, eu sou o Einstein”.
“Você CHOROU,
pai? Nunca te vi chorar! –“Chorei não. Só... me emocionei. É uma emoção muito
grande”.
Chata.
Agora que não estava mais sofrendo tanto tanto de saudade de tudo anterior,
agora que meu coraçãozinho tinha enfim ganhado um relax da contração perdida de
tantos rostos desaparecidos, agora volta essa angústia pra sempre de não estar
lá. O que é quase um remédio, porque fico imaginando que ia agarrar a menina e
não largar mais.
“Você foi
hoje ver sua neta? –Não. Estou respeitando, é o primeiro dia deles em casa. Vou
amanhã”. (tipo muito esforço)
Eu lembro
como é essa sensação. Foi assim quando o meu gato foi lá pra casa. Eu
trabalhava rapidinho pra voltar e ficar com ele. Imagina um ser humano? Um ser
humaninho que abre os olhos, come, dorme, tão esperto esse serzinho, ai meu
Deus, eu não sairia de perto. É bom mesmo esse ser humano ter alguns dias a
mais na Terra quando eu for encontrar com ele, pro bem dela, é preciso que esse
ossos estejam mais fortes para aguentar o tranco.
Os
hormônios das mulheres são realmente coisas catastróficas. Estou chegando à
conclusão que, depois que essa merda toda é jogada no ventilador, lá pros
quinze anos de idade, depois disso a gente não tem mais personalidade, a gente
tem hormônio. O que estiver dominando é o que vai ditar o que você é hoje.
É tão assim
que meu amigo de trabalho, com quem eu trabalhava todo santo dia colada, sabia mais
do que eu das minhas fases ovulares. Um
dia ele disse que eu tenho um ovário demoníaco (o que me faz gritar) e um bom
(o que me faz chorar copiosamente por qualquer coisa, ou seja, bom pra ele, que não
tinha que aguentar minhas ebulições e ainda fingir que não sabia que se tratava
de uma questão ovariana e não de caráter mesmo).
Isso é só o
básico de uma vez por mês. Porque, minha filha, depois dos trinta anos a gente
fica re-tar-da-da. Digo, no sentido do tema de hoje, quando vemos uma criança a
gente para tudo, para o que está fazendo e faz aquela cara de cachorro pro ser.
Eu estou
assim há algum tempo e não desperdiço nenhuma oportunidade de catar crianças
alheias caso os pais consintam. Já passei vergonha, é bem verdade. Amigos já me apelidaram
carinhosamente de “Nazaré”. Em outra ocasião peguei uma criança emprestada
numa festa e não devolvi mais enquanto o pai não veio pedir. E não é que o fdp
veio mesmo pedir? “Posso ficar um pouquinho com ela agora? Estou com saudade”,
foi o que ele me disse. “Tudo bem, fique um pouquinho e depois devolva”, foi o
que respondi.
Ontem
recebi uma foto com a minha sobrinha vestida com a roupinha de personagem do
Super Mário que comprei pra ela assim que fiquei sabendo da gravidez. Tem noção
da minha reação quando vi a foto? AAAAAAAHHHHH! Re-tar-da-da. E as fotos que
recebo dos avôs com ela? Uma criança toda empetecada no colo de um adulto com um ar esmorecido, uma cara de quem acabou de tomar Valium. É assim mesmo?
Fora
a quantidade exorbitante de roupas, acessórios, sapatinhos que andam fazendo
para a pobre da menina. Penso em quantas vezes os pais têm que trocar para dar
tempo de ela usar tudo nessa vida. Deve ser cansativo... Bota roupa, tira foto,
envia para quem deu a roupa, muda de roupa, tira foto, ad infinitum... ai, que
legal!
Ser tia é
achar que é mãe sem ter que passar o café.
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