Outro dia um amigo meu disse que estava procurando apartamento em Vitória. Quer se mudar, e ele disse algo do tipo “vou ver mais apês semana que vem e depois eu escolho”. Que coisa linda, calma, tranquila. Tem a ver com o sonho de uma pessoa, essa coisa de mudar, encontrar um lar pra chamar de seu. Isso, em qualquer parte do mundo, menos na cidade pré-Copa, pré-Olimpíadas e pacificada. Nessa cidade, alugar um apartamento tem mais a ver com bússolas, pederneiras, maquiagem em azul e o momento certo de gritar FREEEEEEEEEDDOMMMMMMMM quando alguém te passa a perna.
Quando decidi me mudar pro Rio, a bem da verdade já estava
meio decidido, meu amasiado havia me perguntado se eu queria mesmo mudar e
arranjou um emprego aqui para eu não ter mais como adiar a decisão, então, resumindo,
quando ele passou na entrevista, eu fiquei responsável pela mudança. Vendi meu
carro, “passei “ a casa onde morava para uma amiga, empacotei minhas coisas com
muita ajuda dos amigos e guardei tudo em um quartinho e na garagem da minha
ex-casa. E vim pra cá, a princípio para ficar na casa de um amigo por algumas
semanas, no máximo estourando um mês, até fechar o apartamento. Foram quase
quatro meses. (Calma, não foi tudo na
casa do meu amigo não, continuamos amigos até hoje, inclusive).
Eu tinha um esquema de guerra: um caderninho só para isso,
ia anotando os endereços que me interessavam, os telefones, e fazia uma agenda repleta
de visitas o dia inteiro. Separava mais ou menos por bairros, para poder ver o
máximo possível de apartamentos no mínimo tempo. No primeiro dia fui de
sapatilha, com uma roupa arrumadinha, pra causar boa impressão. O rastro dos
quilômetros que andei ficaram impregnados nos meus pés por muito tempo, e no
dia seguinte saí de manhã de tênis de correr, roupas confortáveis, garrafa
d’água na mochila. E se você está pensando que eu ia fantasiada de “pessoa
procurando apê”, ia mesmo, e todo mundo também. (Depois de um tempo eu inclusive desenvolvi uma habilidade que é saber de longe quando o pobre coitado está nessa função, apenas pelas roupas, jornal rabiscado na mão e a cara que reúne um misto de desesperança e cansaço de quem está correndo uma maratona há um mês).
Normalmente os corretores abrem os apartamentos para visita
durante uma meia hora, mais ou menos. Ou individual, ou em grupo. Quando é em
grupo, é pior, definitivamente: se o apê é bom, já fica todo mundo olhando um
para a cara do outro e mostrando os dentes. Certa vez, eu estava em uma
situação dessas, num apê lindo, na Glória, e um senhor visitava comigo. Quando
aquele respeitoso senhor percebeu que eu havia gostado do apartamento também,
ele disse para o corretor “sabe, você não vai se arrepender se alugar para mim,
lá em casa somos apenas eu e minha esposa, um casal de velhinhos tranquilos”.
MAS QUE VELHO FDP!!! Que vontade de retrucar “pois lá em casa somos só eu e meu
namorado, e temos energia ainda para cuidar do apartamento, limpar a casa
direito, essas coisas...” VELHO
FDP! FDP! FDP! Mas tá. O velho ser tão fdp e eu pensar e agir desse jeito, é
por causa da dificuldade, pode acreditar.
Isso é quando a casa é boa, porque teve muita coisa ruim.
Tanta coisa, que decidi agora que farei um texto bem humorado só sobre os
apartamentos cariocas. Porque dá pra rir, gente, dá mesmo. Enquanto isso, vou
destrinchando essa história aqui, e ela continua atualizando o contexto
imobiliário do Rio de Janeiro: quando eu procurei pelo meu apê, muita gente que
também estava nessa luta era do Rio mesmo. O aluguel subiu tanto depois desse
lance pré-Copa que muitas famílias que moravam em bairros mais nobres como
Flamengo e Laranjeiras estavam desesperadas tentando mudar para outros, um
pouco mais baratos, como a Tijuca, por sinal, para onde me mudei. Tá pior que
São Paulo, pode acreditar. E isso eu descobri conversando um pouquinho com
algumas pessoas mais educadas, enquanto o corretor não chegava, porque não
aconselho ficar de conversê nem fazer amizade não, que se o apê for legal, você
vai ter que brigar com seu recém-amigo, que chato.
Então, assim foi. Cada dia de saída eu aprendia uma coisa
diferente. Cada dia eu precisava de um documento diferente. A carteirinha de
sócio-fundador do clube de futebol mais importante da sua cidade. A fita VHS
com as imagens da sua primeira comunhão. Uma declaração com firma reconhecida
de seu pai dizendo que nunca traiu sua mãe. Essas coisas. Por isso eu vou pular
a parte triste de descobrir tudo sozinho e passar um servicinho básico para
quem pretende se mudar para outro Estado algum dia.
MUDANÇA
Se você reservou um bom dinheiro para a mudança, existem
grandes empresas que fazem tudo, do tipo você está assistindo tv e toca béééééé,
é da mudança, eles pegam até sua calcinha da gaveta, embalam em caixas novinhas,
deixam lá na gaveta do seu novo apartamento. A Granero, por exemplo, é assim, e
é lindo, mas custa praticamente o dobro de uma mudança à moda antiga, e se o
dinheiro não está sobrando, minha sugestão é que você consiga se planejar e
fazer uma mudança compartilhada. Nesse tipo de mudança você divide o caminhão
com a mudança de outra pessoa (há uma separação interna), mas normalmente pode
levar até quinze dias para que a viagem seja feita. Eu optei por esse tipo, e
tive uma sorte danada: o caminhão estava saindo no dia seguinte para o Rio.
Para essa mudança, você vai ter que dar conta de encaixotar
as coisas o melhor possível. Então descole um esquema com um almoxarifado, ou
com um supermercado, porque caixa boa é difícil de encontrar, viu? E caixa boa
é a MÉDIA, que dá pra você carregar sem
ela rasgar toda, como as muito grandes costumam fazer.
Durante o período que fiquei procurando apartamento, minhas
coisas ficaram na minha antiga casa. Para quem não tem essa opção, existem os
depósitos, mas uma amiga já me falou que gostou desse serviço, outros disseram
que destrói, enferruja tudo. Quando pesquisei, lembro que achei caro. Eles
contam por metro cúbico, é um inferno.
ALUGUEL
Aqui no Rio eles exigem que você só gaste 30% da sua renda
com o aluguel, o que significa que você tem que comprovar a sua renda, e que
ela seja bem boa para conseguir alugar um apê melhor. (Eu, que pedi minhas
contas exatamente para fazer a mudança, tive que entrar com o nome de querido
papai para conseguir alguma coisa.)
As imobiliárias do Rio preferem que você pague o
seguro-fiança a apresentar um fiador. Isso porque se der algum problema, eles
têm dinheiro na mão para sanar. Mas vá preparando o bolso: é caríssimo. Paguei
mais de R$ 2.000,00 por 30 meses, que é o tempo normal do contrato por aqui.
Garagem, no Rio, é como se fosse outro aluguel. Na Zona
Norte você até consegue contratos nos quais o prédio já oferece, mas em outros
bairros, como Santa Teresa, por exemplo, onde é difícil estacionar e a maioria
é de casas, você vai penar para encontrar uma garagem – e também vai pagar caro
por ela.
Esteja com toda a sua documentação quando for procurar o
apartamento. TODA! Xerox dos documentos pessoais básicos e comprovante de renda
de quem vai morar é o mínimo. Você vai precisar disso quando encontrar um apê
bom, porque quando esse ano bissexto acontecer, você vai querer ir direto para
a imobiliária dar entrada na papelada.
Por fim, o mais importante é isso: não dá tempo de pensar.
Olhe com carinho, se gostou, corra atrás na hora, porque outros farão isso, e a
imobiliária dá preferência à quem chegou primeiro. Agora é só investir na sua maquiagem azul e
boa sorte!
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