sexta-feira, 6 de setembro de 2013

O direito de permanecer calado

 
Estou chegando a uma conclusão muito triste. Sempre estranhei o fato de tantos profissionais gastarem tanto tempo de suas vidas com o self promotion – essa é um expressão engraçada para designar isso mesmo que você deve estar imaginando, a auto promoção. Pensei que fosse algo pertinente à minha profissão, tão cheia de egos inflados e machucados, haja vista a exposição que sofremos cotidianamente, não é todo profissional que tem o seu trabalho sendo avaliado por um zilhão de pessoas todos os dias. Mas enfim, o meu desabafo de hoje é que não aguento mais as redes sociais entupidas de gente alardeando o próprio sucesso. Posso ser taxada de invejosa, amarga, whathever, mas definitivamente não é disso que se trata. É um sentimento ainda pior, é entender que as pessoas não conseguem – e às vezes não podem - mais ficar caladas.

Sempre lembro de uma lição básica que permeava a minha casa desde que me entendo por gente. Meus pais passaram muitos e muitos anos tentando mostrar pra mim e meus irmãos como a humildade pode ser gratificante. Claro, lá pelas tantas, meu pai já machucadíssimo de tanto trabalhar e levar as bordoadas que o “sistema hierárquico” (para não falar das pessoas) é capaz de lhe aplicar uma vida inteira, já me dizia, com toda a ironia do mundo, porque eu sei que ele de fato não acreditava nisso, enfim, dizia ele, “minha filha, de vez em quando a gente tem que fazer um self promotion. Esquece tudo o que eu te falei até hoje. No mundo é mais importante falar bem alto que fez do que de fato fazer”. Bela tentativa, mas óbvio que não deu certo, e continuo achando muito mais bonita uma pessoa poderosa e sexy do que carente e vulgar, e as duas podem estar se apresentando com a mesma roupa...

Há algumas semanas fui convidada por uma amiga a acompanhar um ciclo de palestras cabeçudíssimo. O tema é “o silêncio e a prosa do mundo”. Um monte de sociólogos, filósofos e afins estão perdendo seus tempos falando sobre o silêncio o que, em si, já é bastante paradoxal. E um monte de gente com tempo sobrando está destinando algumas horas semanais para ouvi-los, o que é o meu caso. Mas as palestras têm me feito pensar bastante sobre o nosso direito divino de permanecermos calados, que não está mais sendo protegido nos nossos dias. O silêncio, hoje, geralmente é mais carregado de significados que a própria palavra. Quer um exemplo prático? O meu. Eu era uma pessoa pública na minha terra natal. É normal que algumas pessoas me perguntem o que estou fazendo, já que “sumi da TV”. Tenho duas opções: alardear a todo instante o meu “sucesso” nas redes sociais, ou ficar em silêncio, e esta opção provavelmente significará, para muita gente, o meu fracasso.

Isso também acontece atualmente na esfera intelectual. Conversando com um amigo meu, professor, ele ratificou que não tem mais o direito de não ter opinião sobre tudo. As pessoas cobram que ele se posicione acerca de absolutamente tudo o que acontece. “Às vezes é mais fácil manter-se no âmbito das fotos de praia e receitas caseiras”, ele desabafou. “Assim que você se posiciona de determinada forma sobre algum acontecimento, todos esperam que você haja de forma parecida em outros”. Lindamente ele me falou sobre os papeis que resolvemos – ou temos que - desempenhar nas redes, e caí em mim, vivemos, senhores, no tempo da ultra-etiqueta.

Instagram, facebook, fotos de como sou linda, fotos de como minha vida é foda... Claro que se temos amigos, família, ainda mais morando longe, é interessante postarmos um pouquinho da nossa vida para eles acompanharem, e que sejam as partes boas, não acho que seria de bom tom a foto de uma bunda com a legenda “minha vida é cuzona”. E se temos um público, também considero importante alimentar um pouco da sua curiosidade, devolvendo o voto de confiança e a admiração pelo nosso trabalho. Mas tudo tem limite, gente. E ter que gritar aos quatro cantos o quanto se é especial não é mais alardear o sucesso, mas tentar angariá-lo nem que seja pelo grito.
Ainda lembro quando havia recém chegado aqui no Rio, um amigo de Vitória me disse uma frase que não me esqueci, “faça mais, fale menos”. Achei uma boa forma de reajustar os pensamentos na minha cabeça, já que me dei o direito de recomeçar. Não me entendam mal, sou meio viciadinha em instagram e facebook, acontece com todo mundo, e se estou reclamando do conteúdo que está lá é porque eu consumo. Mas estou achando cada vez mais cafona a forma como é utilizado tudo isso. Vai lá, pode me chamar de velha, mas o fato é que às vezes minha vida é tão cuzona que não tenho energia pra tentar provar o contrário em fotos. E às vezes ela está tão extraordinariamente maravilhosa que eu não lembro de compartilhar.

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