Nesse ano que passou, algumas perguntas permearam mais ou
menos 90% das minhas conversas sobre a mudança; foram elas, com alguma licença poética: 1) Por quê? 2) Como foi a mudança? 3) Já está trabalhando? 4) Qual foi a maior dificuldade que você já
passou no Rio? Decidi que vou responder como um site de banco, a primeira
grande resposta aqui, talvez aqui, outras em outros posts, tem coisa que dá mais
trabalho, mas para quem está só numa curiosidade superficial, eu respondo no
lead: 1) leia o texto abaixo; 2) um inferno; 3) sempre estou trabalhando, mas
talvez de um jeito diferente; 4) ser
impossibilitada de fazer o que quero por fatores que, apesar de externos,
continuam a me causar culpa.
1) Por quê?
Tinha alguma coisa errada. Eu morava numa casinha azul, num
bairro bucólico, tinha uma árvore no meu quintal. Já tinha um tempo que queria
namorar, ficar tranquila, e um cara legal apareceu para mim. Sou amasiada, por
assim dizer, porque adoro esse termo, é quase uma sentença de morte, né,
palavra horrível. Bom, dava para ouvir os macacos da floresta que ladeava o
vale onde eu morava, e a temperatura era ligeiramente mais baixa do que no
resto do mundo também por causa da floresta. Na garagem, um carro popular
vermelho bonitinho, no banco, não muita grana. Eu não ganhava muito, e trabalhava
horrores, mas para que se formam os jornalistas? Gostava demais do que estava
fazendo e estava bom por aí. Até porque a casa azul era o centro das reuniões
dos amigos, e não precisava muito mais do que umas caixas de cerveja para fazer
uma festa.
Eu era reconhecida no meu trabalho – não na minha empresa,
como já disse, o salário não era lá essas coisas – mas o público parecia gostar
do que eu fazia. Há seis anos eu trabalhava com TV, num programa de
entretenimento e eu me esmerava para fazer uma matéria totalmente diferente da
outra, degustava os temas, e apreciava o
fato de não ter rotina nenhuma (já acordei às três e meia da manhã, passei um
reboco na cara que não adiantou nada e saí para gravar). A vida estava indo
bem, e eu via o entardecer por entre as folhas do meu quintal.
Quando tudo está assim tão bonitinho, me dá agonia. Que nem
aquelas pessoas que estão sempre sorrindo, fico na esperança de estar por perto
quando tudo desmoronar. Não é exatamente vontade de ver a derrota alheia, é
saber que a vida é feita de ciclos, e quando as coisas vão muito bem, se
prepara. Mas mais do que isso, eu sentia na época que já tinha descoberto tudo
por ali, naquele meu pequeno mundo. Minha órbita já era grande demais para os
que estavam à minha volta, e os meus professores já não tinham mais nada para
me ensinar. Havia um vazio de desafios e eu ansiava por novos mestres.
Foi por isso que decidi “jogar tudo pro alto” (odeio essa
expressão, mas ela foi tão repetida ao longo desse ano que acabei me
acostumando) e mudar, dessa vez fisicamente. Pedi as contas na empresa onde
trabalhava. Meu namorado arranjou um emprego no Rio. Vendi meu carro e fiquei
por conta de agilizar a mudança. Num Rio pré-copa. Mal sabia o que ia me
esperar...
Acho que essa agonia vem também com os trinta anos, para
saber mais sobre a crise leia o primeiro post. Mas mudar fisicamente, posso
garantir, faz algumas dinâmicas da vida se modificarem também. Como o tempo,
por exemplo, que era uma coisa que eu nem imaginava, o tempo, senhores, não é o
mesmo em todas as cidades. A idade também não. Nem o clima, digo, tem a
temperatura, mas isso não define a forma como a gente se sente no inverno ou no
verão. O que eu sei é que uma jornada
nova, por mais difílcil que seja, é nova, e isso faz valer a pena quando a
gente está sofrendo dessa doença, a agonia. E uma das coisas mais bonitas que já
ouvi na minha vida, que me afaga em diversos momentos diferentes, foi uma frase
da minha irmã, que numa outra situação, numa outra vida, ela disse, minha irmã,
se fosse fácil você nem começava.
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