segunda-feira, 2 de dezembro de 2013

O Sofá




Por esses dias eu decidi duas coisas muito importantes na minha vida: comprar o sofá dos meus sonhos e tomar café sem açúcar. É, ao que parece estou tão bem acostumada com meus trinta anos que já ajo como uma quarentona.

O sofá significa tanto, mas tanto pra mim, que é sobre isso que vou encher linguiça hoje. O sofá é a personificação da casa, o espírito de cada lar. Lembro que ainda quando vivia na casa dos meus pais eu dormia mais no sofá do que na minha cama, por vários motivos. Na minha adolescência eu era tão bagunceira que não conseguia me acomodar direito no meio de todas as roupas, colares, pulseiras, papeis, enfim, tudo que eu ia usando e largando em cima da cama. Quando queria muito dormir ali, fazia um rocambole usando a colcha para me livrar daquilo tudo, ia girando aquele bololô e depois tacava no chão. A dica é ótima, aliás, para quem é bagunceiro, pois no dia seguinte basta recolocar o rocambole e ir girando ao contrário, a cama fica exatamente como estava no dia anterior. Então, mas o texto é sobre sofá, e o sofá da casa dos meus pais era realmente ótimo. Me cabia direitinho dormindo de lado e eu ainda podia acompanhar todo o ritmo da casa, as pessoas conversando, vendo TV e eu ia adormecendo lentamente no meio daquilo tudo.

Ou então me salvava quando eu tinha chegado de madrugada. Eu dividia o quarto com minha irmã e ela tem o sono super leve, então muitas vezes eu preferia uma opção mais confortável do que ouvir suas reclamações, ainda mais quando eu já chegava meio alta e ia batendo em todos os cantos do quarto no meio da noite, crente que estava sendo super silenciosa. Por tudo isso, o sofá sempre foi minha primeira opção.

Bom, aí eu fui morar sozinha, e quando me mudei não tinha móveis. Comprei o basicão e achei que a vida ia se encarregar de prover o resto. Não demorou muito, foram apenas uma ou duas festas com móveis de papelão, mais umas tantas com móveis de plástico, numa delas ainda bem que não tinha móveis, um sujeito vomitou um quarto completamente pelado, digo isso do quarto, não sei como o sujeito estava, e bem, lógico que ele atentou de fazer isso na esquadria da janela de alumínio para dar algum trabalho à limpeza, senão não tinha graça. Limpar esquadrias é uma coisa realmente chata. Estou pensando em comprar um aspirador para fazer isso. E uma daquelas vassouras cuja piaçava é de espuma, para limpar as janelas da minha cozinha, função à qual já abdiquei há algum tempo e que agora dá sinais da sua importância, mas piaçava de espuma e aspirador é cinquenta anos já, acho que posso esperar mais, não completa nem um ano mais pra eu refazer o contrato do aluguel ou sair daqui, nem vale a pena limpar essas janelas agora. O que me incomoda mesmo são os duendes que estão vivendo com os fios atrás do hack. Ah, eles deviam ser aspirados, com certeza. Mas voltemos ao sofá.

Foi uma taróloga que veio me dar esporro, inclusive no meio de uma consulta. Ela falou que minha casa tava parecendo um camping (boa, a menina, nem nunca esteve lá) e que eu precisava começar a cuidar dela, transformá-la num lar. Foi aí que apareceu o primeiro sofá da minha vida. Ganhando uma mixaria, esse móvel ficava sempre na última prioridade, mas a vida é uma caixinha de surpresas, e meu sofá estava na minha frente, e um dia eu vi. A secretária do departamento onde eu trabalhava sabia que eu ia ganhar um extra, também uma mixaria inclusive, e me vendeu o sofá e o hack que ela acabara de comprar, mas que não poderia ficar com eles porque voltaria para a casa da mãe, que precisava do seu auxílio. Ou seja, um presente.

Chegamos, enfim, à contemporaneidade. Eu e meu namorado entramos algumas vezes na loja que se chama “Toque a Campainha”, hahahahahahhahahahah, que nome é esse Braseeeelll???, e nenhum atendente mais parecia querer atender aquele casal que adorava sentar em sofás grandes e bonitos e nunca levar nada. Mas esse cenário mudou! E na semana passada, levamos O Sofá! Um sofazão grande e gordo que se abre inteiro pra você, esparrama sua cabeça, te abraça e fala que vai te amar pra sempre. Um retrátil café gigantesco e sólido, que vai até o chão e não te deixará nunca mais cair na vida, e nem se sentir sozinho de tudo, ele estará lá, nos melhores e nos piores momentos, o Sofá da minha vida inteira. Agora preciso arranjar apartamentos para morar com cozinha boa, área de serviço e sala que caiba o Sofá.

O antigo, não vou me fazer de ingrata por todos esses anos, mas o fato é que ele parecia uma criança da propaganda Médicos sem Fronteiras do lado do Sofá. Coloquei em sites de venda por um preço absurdo de barato (não ia me sentir bem em ganhar mais do que a mixaria que paguei nele, há anos atrás) e teve gente choramingando pra ficar com o dito cujo. Contra minha ética acabei dando prioridade a um universitário que chorou mais (e arranjou logo um carro pra carregá-lo da minha casa). No elevador, brevemente, ele me contou a sua história: se formaria no dia seguinte e resolveu se presentear com um sofá porque não aguentava mais a casa com cara de universitário por anos a fio. Me senti uma velhaca ao compreender totalmente o que ele dizia, pensando que já havia passado também por isso.


“Putz, o sofá é lindo! Porque você quer se desfazer dele???” disse o garoto assim que botou os olhinhos quase marejados no sofazinho. “Porque eu prefiro o pai dele”, disse eu, exibindo meu Sofá forte e viril e retrátil como um jogador de basquete que estende as pernas na praia. Em vão. O garoto permanecia vidrado no sofazinho, feliz que estava com sua aquisição a preço de banana, ainda sem acreditar que a vida, ah, a vida, a vida é uma caixinha de surpresas que havia lhe dado um presente. Depois desisti de chamar a atenção com o meu grande móvel urso e fui em frente, “você tem interesse em ficar com essa mesinha de centro? Ficou apertada depois que o Sofá chegou aqui”, “Claro, claro, claro que sim”, ele continuava não acreditando, “Minha mesinha é um carretel, era o que eu precisava, quanto você quer por ela?”, “É um presente de formatura”, “Não, gente, quê isso? Vou mandar convites da festa para vocês”, e lá se foi o garoto com um amigo a tiracolo carregando os móveis da minha casa e largando pra trás umas notas de cinquenta. E eu estou aqui, a muito custo, tomando um café sem açúcar, e logo mais vou dar uma faxina na minha casa e talvez fazer minhas unhas, que programei com meu namorado de sairmos hoje, apesar que pode ser muito muito difícil eu sair de casa durante um mês ou dois.


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